quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Clássico

Os académicos alexandrinos propuseram pela primeira vez a designação de clássicos para os textos literários da cultura grega arcaica e criaram regras próprias para as obras contemporâneas que pudessem suportar tal categoria. Fixou-se então a ideia de clássico como obra exemplar cuja excelência é capaz de resistir ao tempo. A cultura romana garantiu a canonização da cultura grega e continuou a aceitar as melhores obras gregas antigas como clássicos. Mas primeiro estabelecera uma divisão social: classicus era o cidadão por excelência, que pertencia à primeira das cinco classes em que os Romanos se dividiam. No século II, d.C., Aulo Gélio, o primeiro a trazer o termo para a literatura, em Noctes Atticae, cunhou as seguintes expressões: o scriptor classicus, aquele que escrevia para a classe dos mais favorecidos social e politicamente e era, por isso, um escritor notável e exemplar, e o scriptor proletarius, aquele que escrevia para as classes letradas de menor condição social e era ele próprio um indivíduo das classes baixas. Gélio já introduz a ideia que ainda hoje temos de um clássico: deve ser anterior a nós e deve constituir um modelo de referência. Na Idade Média, um clássico é apenas aquele que estuda numa classe e num espaço próprio para o estudo, sem que a excelência do indivíduo ou da sua obra esteja em causa. Esta tradição já não prevalece na Idade Moderna, que consagra a ideia de clássico para as grandes obras da cultura greco-romana. A ideia do respeito pela obra dos antigos foi largamente divulgada pelos humanistas. Os seguintes versos de António Ferreira podem resumir a ideia de clássico que então se fixou: os verdadeiros homens (ou clássicos, mesmo que a palavra não seja pronunciada textualmente) são os que se “afamam / com letras, com saber, com que alumiam / o mundo, e tudo o mais Fortuna chamam” (Carta a João Rodrigues de Sá de Meneses). Este espírito de redescoberta das obras exemplares da Antiguidade levou os historiadores da literatura a falar em períodos “clássicos” não necessariamente coincidentes no tempo nas várias literaturas: por exemplo, o século XVI, para Portugal, a segunda metade do século XVIII, para a França, e a época entre Milton e Pope, em Inglaterra.
Carlos Ceia

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