Era um peixe.
Um peixe brilhante, feliz, mas muito distraído. Tinha olhos grandes...como outros peixes...mas os olhos dele viam coisas que os outros peixes não viam.
Gostava de ficar a olhar as estrelas...dizia que estava apaixonado por uma delas...uma estrela cadente...
Muitas vezes deixava-se ficar, com a cabeça apoiada sobre as guelras, a olhar o céu infinito...Sabe-se lá o que se passava naquela cabeça grande de peixe.
Quando a maré começava a vazar os outros peixes chamavam-no...anda daí...não sejas parvo...vais morrer...Mas nada o fazia sair daquela pequena poça...quase vazia...até que ficava sem ar...moribundo...a deixar a vida esvair-se com a água que se afastava. Tentava saltar, apanhar a água, mas já não tinha mais forças...só lhe restava despedir-se da sua estrela e deixar-se envolver nos braços frios da morte.
De repente, como por milagre, uma onda maior encheu a pequena poça onde o desgraçado agonizava. Respirou...abriu os olhos...olhou as estrelas e dizem que até sorriu. Apoiou a cabeça nas guelras e deixou-se ficar a contemplar as estrelas.
Só pode ser amor...
Vício das Letras
terça-feira, 21 de julho de 2015
Andorinha atrevida
Debruçada na janela da casa olhava para a rua sem prestar atenção a nada em especial. Absorta nos meus pensamentos deixava vaguear o olhar como se nem estivesse ali, naquele lugar.
De repente, senti algo que passava, muito rapidamente, mesmo em frente do meu nariz...uma vez...outra...mais outra.
Arrumei os pensamentos...mais tarde voltarei a eles...é inevitável...e decidi prestar atenção aquele intruso que de forma tão atrevida vinha perturbar-me.
Foi pousar num galho seco muito perto de mim, encarou-me e, cor ar de poucos amigos, perguntou-me:
- O que estás a fazer?...
- Estou a pensar...
- E para que serve pensar?...
- Ora...serve para ajudar a tomar boas decisões, sem erro...e também serve para viver...
- Viver?...
- Sim...viver coisas impossíveis...chama-se sonhar acordado...
- Não acredito nisso...parece-me coisa de tontos...
- Porque não és uma pessoa...és só uma pequena andorinha...
- Pode até ser...mas se vais ficar aí, com esse ar de quem quer e não quer...vai e não vai...não me parece que consigas grande coisa. Já te vejo assim há muito tempo...Acredita que gostava de ajudar-te...a perder o medo...
- Medo?...qual medo?...eu não estou com medo de nada...
-Pois, pois...se ficas tanto tempo a pensar...só pode ser por medo que não sais daí. E agora se me dás licença, tenho muito que fazer...Adeus.
- Adeus minha amiga andorinha...quem me dera poder voar contigo...
De repente, senti algo que passava, muito rapidamente, mesmo em frente do meu nariz...uma vez...outra...mais outra.
Arrumei os pensamentos...mais tarde voltarei a eles...é inevitável...e decidi prestar atenção aquele intruso que de forma tão atrevida vinha perturbar-me.
Foi pousar num galho seco muito perto de mim, encarou-me e, cor ar de poucos amigos, perguntou-me:
- O que estás a fazer?...
- Estou a pensar...
- E para que serve pensar?...
- Ora...serve para ajudar a tomar boas decisões, sem erro...e também serve para viver...
- Viver?...
- Sim...viver coisas impossíveis...chama-se sonhar acordado...
- Não acredito nisso...parece-me coisa de tontos...
- Porque não és uma pessoa...és só uma pequena andorinha...
- Pode até ser...mas se vais ficar aí, com esse ar de quem quer e não quer...vai e não vai...não me parece que consigas grande coisa. Já te vejo assim há muito tempo...Acredita que gostava de ajudar-te...a perder o medo...
- Medo?...qual medo?...eu não estou com medo de nada...
-Pois, pois...se ficas tanto tempo a pensar...só pode ser por medo que não sais daí. E agora se me dás licença, tenho muito que fazer...Adeus.
- Adeus minha amiga andorinha...quem me dera poder voar contigo...
Luzia Santos
Na praia
Sentada na areia da praia, ouvido colado ao barulho das ondas, olhar perdido no vai e vem dos barcos, deixava vaguear os meus pensamentos.
Ela chegou...devagar...suave...delicada...pousou a poucos metros de distância do lugar onde me encontrava. Percebi-lhe o olhar atrevido...desafiante...mas não me deixei intimidar. A praia não é só dela...não é a casa dela. Durante uns momentos ficamos a fazer cara feia uma para a outra, tal como duas rivais...como se aquele lugar...aquelesossego...fosse só de uma de nós...como se a outra fosse uma intrusa e estivesse ali só a incomodar...a atrapalhar os sonhos.
Fiquei quieta, fingi não me importar...ela fez o mesmo.
Passado algum tempo, com todo o cuidado, retirei do saco a máquina fotográfica que me acompanha sempre. Com movimentos leves, para não a assustar, captei a imagem...depois mais uma...e outra ainda. Pareceu não se importar.
Com ar descarado avançou uns passos e empinou o queixo...quer dizer, o bico...Olhou com interesse para o céu como se fosse para isso que ali estava, andou de um lado para o outro, abriu e fechou várias vezes as asas, como se eu ali não estivesse.
De repente, olhou-me com ar de desafio, bateu as asas com mais força e voou. Deu uma volta sobre mim, gritou bem alto o que me pareceu uma gargalhada provocadora e foi-se embora voando alto...cada vez mais alto.
Não sei se é da minha imaginação mas pareceu-me que o seu olhar e o seu grito troçavam de mim...era como se dissesse...anda daí, se és capaz...não queres voar atrás dos seus sonhos?...então mostra lá.
Agora pensando bem...será que foi mesmo assim?...ou estarei a divagar?...
Não sei bem...talvez algures esteja uma gaivota de bico amarelo a troçar de mim...ou talvez não.
Luzia Santossmile emoticon
Ela chegou...devagar...suave...delicada...pousou a poucos metros de distância do lugar onde me encontrava. Percebi-lhe o olhar atrevido...desafiante...mas não me deixei intimidar. A praia não é só dela...não é a casa dela. Durante uns momentos ficamos a fazer cara feia uma para a outra, tal como duas rivais...como se aquele lugar...aquelesossego...fosse só de uma de nós...como se a outra fosse uma intrusa e estivesse ali só a incomodar...a atrapalhar os sonhos.
Fiquei quieta, fingi não me importar...ela fez o mesmo.
Passado algum tempo, com todo o cuidado, retirei do saco a máquina fotográfica que me acompanha sempre. Com movimentos leves, para não a assustar, captei a imagem...depois mais uma...e outra ainda. Pareceu não se importar.
Com ar descarado avançou uns passos e empinou o queixo...quer dizer, o bico...Olhou com interesse para o céu como se fosse para isso que ali estava, andou de um lado para o outro, abriu e fechou várias vezes as asas, como se eu ali não estivesse.
De repente, olhou-me com ar de desafio, bateu as asas com mais força e voou. Deu uma volta sobre mim, gritou bem alto o que me pareceu uma gargalhada provocadora e foi-se embora voando alto...cada vez mais alto.
Não sei se é da minha imaginação mas pareceu-me que o seu olhar e o seu grito troçavam de mim...era como se dissesse...anda daí, se és capaz...não queres voar atrás dos seus sonhos?...então mostra lá.
Agora pensando bem...será que foi mesmo assim?...ou estarei a divagar?...
Não sei bem...talvez algures esteja uma gaivota de bico amarelo a troçar de mim...ou talvez não.
Luzia Santossmile emoticon
Era Natal
Na paragem do autocarro aguardei tranquilamente a hora da partida...o que tinha para fazer podia esperar...
Sentei-me e deixei-me ficar olhando sem prestar grande atenção às pessoas que por ali passavam.
Ele chegou e sentou-se espaçosamente entre mim e uma outra passageira. Meteu conversa com ela...
- De que terra é?...
- Eu?...não tenho terra nenhuma...
- Ora essa...não me diga que tem vergonha de dizer qual é a sua terra...pois eu cá não tenho vergonha de nada...digo tudo...era só o que faltava...
- Não...não é isso...o senhor estava a brincar...respondi a brincar também...sou de Cabo Verde...
- Ah!...pois...é tão bonita...tão branquinha...Tem o quê, cinquenta anos?...
Aqui ela soltou uma fresca gargalhada, eu sorri e creio que os passageiros que ali se encontravam sorriram também. Nitidamente ambos tinham mais que setenta anos.
- E tem uma fala bonita...
Não ouvi o resto da conversa...o senhor era espaçoso e aos poucos ocupou também o meu lugar...não tive outro remédio senão levantar-me...creio que nem reparou que eu ali estava.
Não ouvia o que diziam mas passado algum tempo ( o autocarro estava atrasado) vi que mostravam os telemóveis um ao outro...fotografias dos netos certamente...
Não sei se trocaram contatos nem se prometeram voltar a encontrar-se mas tenham a certeza que regressaram às suas casas mais felizes e mais ricos.
Mentalmente desejei-lhes um Feliz Natal e que a vida lhes dê ainda muitos bons momentos...assim...cheios de disposição.
É bom...encontrar pessoas felizes.
Luzia Santos
Sentei-me e deixei-me ficar olhando sem prestar grande atenção às pessoas que por ali passavam.
Ele chegou e sentou-se espaçosamente entre mim e uma outra passageira. Meteu conversa com ela...
- De que terra é?...
- Eu?...não tenho terra nenhuma...
- Ora essa...não me diga que tem vergonha de dizer qual é a sua terra...pois eu cá não tenho vergonha de nada...digo tudo...era só o que faltava...
- Não...não é isso...o senhor estava a brincar...respondi a brincar também...sou de Cabo Verde...
- Ah!...pois...é tão bonita...tão branquinha...Tem o quê, cinquenta anos?...
Aqui ela soltou uma fresca gargalhada, eu sorri e creio que os passageiros que ali se encontravam sorriram também. Nitidamente ambos tinham mais que setenta anos.
- E tem uma fala bonita...
Não ouvi o resto da conversa...o senhor era espaçoso e aos poucos ocupou também o meu lugar...não tive outro remédio senão levantar-me...creio que nem reparou que eu ali estava.
Não ouvia o que diziam mas passado algum tempo ( o autocarro estava atrasado) vi que mostravam os telemóveis um ao outro...fotografias dos netos certamente...
Não sei se trocaram contatos nem se prometeram voltar a encontrar-se mas tenham a certeza que regressaram às suas casas mais felizes e mais ricos.
Mentalmente desejei-lhes um Feliz Natal e que a vida lhes dê ainda muitos bons momentos...assim...cheios de disposição.
É bom...encontrar pessoas felizes.
Luzia Santos
Sonho
Lembrei-me agora...assim...de repente.
Estamos na casa da aldeia, onde há uma grande mesa de madeira velha.
À chaminé a lenha estala e as labaredas sobem coloridas e brincalhonas.
Há mulheres em volta do fogão, onde há pouco me encontrava, e da mesa que ainda está posta. Há muita conversa e gargalhadas. As crianças estão animadas, têm as faces coradas pelo calor da lareira e pela felicidade que paira no lugar.
Já é noite...não sei quantas horas...ouvi há pouco o sino da aldeia mas não contei as badaladas. Também não interessa...não tenho nada melhor para fazer e não quero sair daqui...está quente e cheira a café e a bolos acabados de fazer.
Tu estás ali, naquela cadeira de que tanto gostas, a ler o teu livro. Tens aquela camisola preta e o casaco verde que te põe nos olhos aquela cor adocicada.
Chamas-me para mostrar qualquer coisa que acabaste de ler e achaste interessante...puxo o tapete, coloco a almofada aos teus pés e sento-me nela. Fico quieta a ouvir o que tens para me contar e tenho vontade de ficar ali para sempre, naquele lugar quente e com cheiro a café.
Lá fora começa a chover...ninguém se importa.
As mulheres continuam a tagarelar alegremente e as crianças continuam a sorrir de faces coradas.
De repente...de repente acordei.
Luzia Santos
Estamos na casa da aldeia, onde há uma grande mesa de madeira velha.
À chaminé a lenha estala e as labaredas sobem coloridas e brincalhonas.
Há mulheres em volta do fogão, onde há pouco me encontrava, e da mesa que ainda está posta. Há muita conversa e gargalhadas. As crianças estão animadas, têm as faces coradas pelo calor da lareira e pela felicidade que paira no lugar.
Já é noite...não sei quantas horas...ouvi há pouco o sino da aldeia mas não contei as badaladas. Também não interessa...não tenho nada melhor para fazer e não quero sair daqui...está quente e cheira a café e a bolos acabados de fazer.
Tu estás ali, naquela cadeira de que tanto gostas, a ler o teu livro. Tens aquela camisola preta e o casaco verde que te põe nos olhos aquela cor adocicada.
Chamas-me para mostrar qualquer coisa que acabaste de ler e achaste interessante...puxo o tapete, coloco a almofada aos teus pés e sento-me nela. Fico quieta a ouvir o que tens para me contar e tenho vontade de ficar ali para sempre, naquele lugar quente e com cheiro a café.
Lá fora começa a chover...ninguém se importa.
As mulheres continuam a tagarelar alegremente e as crianças continuam a sorrir de faces coradas.
De repente...de repente acordei.
Luzia Santos
quinta-feira, 16 de julho de 2015
É proibido
"É proibido chorar sem aprender,
Levantar-se um dia sem saber o que fazer
Ter medo de suas lembranças.
É proibido não rir dos problemas
Não lutar pelo que se quer,
Abandonar tudo por medo,
Não transformar sonhos em realidade."
Pablo Neruda
O sorriso
O SORRISO
Creio que foi o sorriso,
o sorriso foi quem abriu a porta.
Era um sorriso com muita luz
lá dentro, apetecia
entrar nele, tirar a roupa, ficar
nu dentro daquele sorriso.
Correr, navegar, morrer naquele sorriso.
o sorriso foi quem abriu a porta.
Era um sorriso com muita luz
lá dentro, apetecia
entrar nele, tirar a roupa, ficar
nu dentro daquele sorriso.
Correr, navegar, morrer naquele sorriso.
EUGÉNIO DE ANDRADE
Subscrever:
Mensagens (Atom)