sábado, 7 de julho de 2012

Backès

«Esta obra, graças ao talento do autor, é de uma extraordinária e paradoxal leveza. É uma personalidade, forte, grave e repentista, simultaneamente. Todos os textos estão citados em versão original (grego, latim, francês antigo, russo, inglês, alemão, espanhol, português) e em tradução. Esta convocação de vozes estrangeiras cria a beleza. A maqueta oferece percursos muito variados. Encontramos jogos, sob a forma de perguntas e respostas, estas a procurar três páginas mais adiante. Não nos aborrecemos. E tudo isto é, no entanto, muito sério. Nas notas, em corpo pequeno, encontramos as biografias dos escritores, resumos de obras e definições. O primeiro capítulo coloca a questão principal: Existe uma literatura europeia? E cedo nos apercebemos que todo este livro é pontuado por questões. Este livro erudito é o livro das questões. A elas o autor não responde sempre: Ainda uma questão insolúvel. É que para Backès, como maravilhosamente escreve após ter evocado Homero e Hamlet (There are more things in heaven and earth...), a história da literatura europeia é a da curiosidade insaciável. Um livro óptimo para percorrer solitariamente e a devorar com pequenas dentadas, com uma insaciável gulodice.» «O autor define a literatura europeia (completamente diferente da soma das literaturas de cada país), explica porquê e como ela existe e desenvolve-lhe, passo a passo, a história, desde o início da nossa era até ao nosso século, antes de tomar os assuntos tematicamente (poesia, romance, etc.). Este grande livro, que poderia ser penoso, é de leitura fácil graças à sua divisão em capítulos muito curtos (cerca de duas páginas) e à clareza de redacção: em nota, breves, mas numerosas, notícias sobre os autores e a sua obra; em quadros, os textos citados (igualmente numerosos; sempre com tradução) e os comentários sobre pontos precisos. Em suma, uma mina de ensinamentos, muito útil e comodamente explorável.» Bulletin de Lâ 'Association des Amis de lâ 'Ecole Normale Supérieure

Robert Musil

Uma obra singular e única no panorama da ficção do século XX, um dos mais importantes livros da literatura mundial. Mais do que um romance, "O Homem Sem Qualidades" é o maior projecto romanesco, deliberada e quase necessariamente inconcluso e inconclusivo, da literatura do século passado.
No momento da morte inesperada de Musil em 15 de Abril de 1942, no exílio de Genebra, "O Homem Sem Qualidades" é verdadeiramente o “livro por vir”, aquele cuja essência – no seu protagonista acentrado, no processo da sua génese, no cerne do seu pensamento – é a de um laboratório de possibilidades que o transformarão na obra aberta por excelência e na “tarefa criadora [mais] desmedida” da história da literatura moderna. "O Homem Sem Qualidades" será, durante mais de duas décadas, a obra em processo de criação e transformação que se autonomiza e se impõe de forma obsessiva e implacável ao próprio criador, aprendiz de feiticeiro que a controla cada vez menos à medida que ela se vai transformando numa rede rizomática de possibilidades de crescimento e de perspectivas de finalização sempre adiada, que parece querer reflectir o próprio feixe aleatório de possibilidades que é aquilo a que chamamos “realidade”.
Se a ironia é neste livro, como diz Blanchot, “um dom poético e um princípio de método” que modula, não apenas a palavra mas também a própria composição romanesca, na oposição contrapontística permanente e irresolvida entre “a exactidão e a alma”, a reflexão e os sentimentos, o indivíduo em busca de si e o mundo dos factos (nas vésperas da Primeira Grande Guerra), essa mesma ironia haveria de determinar todo o acidentado e contraditório processo de génese e de publicação deste objecto literário esquivo que, ao contrario do que frequentemente se tem dito, será mais um não-romance do que um anti-romance.